Quando o corpo fala: o que você tem ignorado sem perceber?
Em meio às pressões do cotidiano, aprendemos a silenciar os sinais do corpo. Cansaços que insistem, dores que se repetem, alterações no sono ou no apetite — tudo isso, muitas vezes, é a forma que o corpo encontra para dizer: "preste atenção em mim". Neste texto da série Entre Passos, propomos uma pausa para escutar o corpo com mais presença e sensibilidade. Ao invés de enxergar o incômodo como obstáculo, que tal percebê-lo como convite à reconexão? Dores físicas podem carregar mensagens emocionais, e pequenas tensões diárias são, por vezes, alertas silenciosos de que algo precisa mudar. Vamos falar também sobre as diferentes formas de recarregar a energia — seja no recolhimento ou na convivência — e como respeitar os próprios ritmos pode ser um ato profundo de autocuidado. O texto propõe reflexões práticas e perguntas acessíveis para iniciar um novo tipo de escuta: uma escuta que valoriza o corpo como guia, não como inimigo. Se você tem se sentido cansado sem saber por quê, ou percebe que está vivendo no piloto automático, este pode ser um bom momento para fazer uma pausa e se escutar de verdade. O seu corpo tem muito a dizer. E talvez ele esteja apenas esperando que você comece a ouvir.
Carla Regina Nascimento de Paula
4/21/20254 min read
Entre Passos — O que o seu corpo tem tentado dizer?
Em meio às tarefas, prazos e expectativas que o cotidiano nos impõe, aprendemos — muitas vezes sem perceber — a silenciar o corpo, ignorando suas sensações e abafando incômodos em nome da pressa e da produtividade. A rotina se torna tão acelerada que acabamos seguindo em frente mesmo quando algo em nós grita por uma pausa necessária.
Mas o corpo, mesmo que não seja escutado, continua tentando se comunicar. Ele fala sempre — por meio de sinais sutis ou de manifestações intensas. E, quanto mais insistimos em não ouvir, mais ele tenta chamar nossa atenção, seja por pequenas fadigas, seja por dores persistentes, tensão muscular ou aquele cansaço que não passa, por mais que a gente descanse.
Dores recorrentes, como aquela fisgada no ciático, ou a rigidez nos ombros, não são meros desconfortos passageiros. Muitas vezes, elas são alertas do nosso organismo, chamando para um olhar mais atento sobre como estamos conduzindo a rotina. Por trás de cada incômodo, há um pedido por mudança, cuidado e respeito aos próprios limites.
Talvez a dor no ciático esteja dizendo: vamos alongar? Vamos nos tornar mais maleáveis, por dentro e por fora? A tensão nas costas pode estar sussurrando: isso que você está carregando ainda precisa estar aí? E o cansaço persistente, por sua vez, pode ser um sinal claro de que há um limite sendo ultrapassado há tempo demais, pedindo uma pausa antes que o corpo cobre um preço mais alto.
No entanto, não são apenas as dores mais evidentes que trazem mensagens. O corpo também fala através das pequenas alterações diárias: o sono que se fragmenta sem motivo aparente, o apetite que diminui ou aumenta em períodos de estresse, a respiração que se torna superficial sem que percebamos. Cada sintoma, por menor que seja, é muitas vezes um convite para interromper o automático e prestar atenção no presente.
Ao nos desconectarmos do corpo, não estamos sendo descuidados — estamos, na verdade, respondendo a padrões aprendidos desde cedo. Fomos ensinados a valorizar a produtividade, a eficiência, o desempenho, quase sempre em detrimento do que sentimos. Aprendemos a priorizar resultados e metas, colocando o próprio bem-estar em segundo plano. Mas há um custo alto quando negligenciamos nossas necessidades físicas e emocionais.
Escutar o corpo exige tempo, disponibilidade e uma dose de coragem para pausar. Exige reconhecer que o nosso valor não está apenas em entregar, mas também em sentir, perceber e cuidar. Esses momentos de escuta são, portanto, essenciais para realinhar o ritmo da vida com a nossa essência e necessidades reais.
Quando propomos essa escuta, estamos falando sobre um ato de reconciliação interna. Sair do piloto automático e se perguntar, com genuíno interesse: como eu realmente estou? É criar espaço para perceber não apenas as dores, mas também os prazeres, os sinais de alegria e de satisfação corporal que muitas vezes passam despercebidos.
Essa escuta atenta pode revelar muito mais do que desconfortos. Pode nos apontar novos caminhos de autocuidado, inspirar transformações de hábitos, redefinir nossas prioridades e ajustar o ritmo do dia a dia. Quando ouvimos com verdade, percebemos o que precisamos soltar, o que deve ser reequilibrado e o que merece ser cultivado com mais carinho.
A escuta transforma. E ela começa no silêncio que aceitamos ouvir.
É exatamente nesse ponto que entra o poder da pausa. A pausa não significa parar a vida, mas sim criar intervalos conscientes entre uma tarefa e outra, entre um pensamento e outro. Esses pequenos momentos de desaceleração são essenciais para renovar a energia e recuperar a sensibilidade para os próprios sinais.
A pausa pode assumir mil formas: um minuto de respiração profunda, um alongamento leve entre uma atividade e outra, um banho tomado com presença, um passeio breve ao ar livre, ou um instante de olhos fechados para silenciar a mente. Pode ser o silêncio de um quarto escuro ou o suave toque das mãos sobre os próprios ombros. Cada pessoa encontra o gesto que melhor serve como âncora para retornar ao presente.
É importante lembrar que somos singulares. Para alguns, a recarga acontece no recolhimento e silêncio; para outros, nasce na convivência, na troca, no riso compartilhado. Costumamos chamar esses polos de introversão e extroversão, mas na verdade todos temos um pouco de cada em nós — e as necessidades podem mudar de acordo com o momento da vida. Respeitar os próprios ciclos é fundamental.
Introversão não é sinônimo de timidez, assim como extroversão não significa ser sempre expansivo. São apenas formas diferentes de abastecimento interno. Por isso, questione rótulos e se permita aprender com a própria experiência: o que te recarrega? O que te esgota? Quais ambientes favorecem seu equilíbrio físico e emocional?
Olhar para essas questões com honestidade abre espaço para um cuidado mais consistente e verdadeiro. O corpo sempre comunica, seja através do prazer ou do desconforto. Restabelecer o contato com essas mensagens permite cultivar uma rotina mais coerente com quem você é.
Para começar esse processo de reconexão, experimente se fazer perguntas simples — mas profundas — ao longo do dia:
Quais dores têm sido recorrentes — físicas, emocionais ou existenciais? Qual a frequência e quando aparecem?
Em que momentos do dia percebo maior tensão? E quando me sinto mais leve, relaxado ou feliz?
O que acontece com meu corpo quando eu ignoro o que sinto? Consigo perceber mudanças de humor, de energia ou de disposição?
E o que muda quando, por alguns minutos, eu paro e me escuto, seja respirando fundo, seja fechando os olhos e sentindo o próprio corpo?
Que sinais sutis meu corpo tem enviado ultimamente? Sono, apetite, postura, ritmo de respiração — há algo diferente?
Que pequeno gesto de autocuidado posso incluir hoje em minha rotina para honrar o que sinto agora?
Não se trata de encontrar respostas perfeitas imediatamente. O mais importante é cultivar a abertura, exercitar a curiosidade e o acolhimento diante do que surge. Quando você se permite escutar com verdade, descobre que há um universo inteiro de sabedoria silenciosa esperando para ser notado e valorizado.
Lembre-se: leveza não nasce da ausência de esforço, mas do alinhamento entre o que você faz e o que o corpo e a alma realmente pedem.
Permita que o corpo seja seu guia, seu mapa e seu aliado na busca por uma vida mais autêntica, presente e sustentável.
Dê atenção, escute, cuide — e siga em frente com um passo de cada vez, mais inteiro e consciente a cada jornada.